Saber ler, saber escrever, saber falar

A missão de formar utilizadores de informação e do conhecimento pode centrar-se sobre o trabalho de projecto, uma vez que este implica recolha, compreensão, avaliação processamento e organização da informação com vista à sua apresentação a um determinado público. A comunicação (final ou de controlo do processo) faz parte do processo, não sendo apenas um testemunho final.
A formação de leitores passa pela formação de escritores… Talvez pareça afirmação estranha, mas deixa de o ser, se for explicada. É óbvio que se pode ser um leitor apaixonado e compulsivo sem se ser um escritor exímio. No entanto, é preciso observar duas coisas:
1) A primeira delas, é o facto de a perícia e a capacidade de desenvolvimento das capacidades de escrita por parte dos leitores é, em média, maior do que por parte dos não-leitores. A leitura frequente e diversificada põe-nos em contacto com vocabulário, estilos de escrita, modelos de texto, pensamentos, ideias e formas de organização de informação que nos inspiram e servem de alicerce para adquirirmos conhecimentos e para desenvolvermos o nosso próprio estilo. No entanto, se queremos desenvolver alguma capacidade, temos de a praticar. Sabemos que a leitura feita à deriva do virar das páginas, sem rumo e sem espírito inquisitivo e analítico, por muito prazer que possa dar, não produz um conhecimento tão organizado e profundo como uma leitura em que se sublinha, se toma nota, se volta atrás para fazer revisões, se comparam passagens ou textos diferentes. Este é o tipo de leitura sobre o qual se concentra este trabalho: a leitura que serve de apoio à capacidade de produzir análises, sínteses, discussões de ideias e textos originais. É o tipo de leitura que serve de base ao trabalho de projecto e de criação – o tipo de leitura que deve ser dominado por profissionais que utilizem a informação e o conhecimento nos seus trabalhos.
Este tipo de leitura estruturada e produtiva necessita de orientação e de treino. O seu fito é a recolha, organização ou produção de conhecimento. É importante treiná-la porque à maior parte das pessoas não basta correr os olhos pelo texto (ou ouvi-lo) para reter e compreender a informação que é transmitida. A interiorização da informação, ou seja, a sua transformação em conhecimento útil e aplicável em situações novas e diversas necessita de um trabalho em que o leitor desmonta as peças do texto e as monta de novo – por vezes com uma organização diferente, que é aquela que lhe permite melhor recordar ou gerir a informação, ou aquela que lhe melhor lhe permite cruzar os dados recolhidos com outros conhecimentos que já possua.
Como é que a escrita se reflecte na leitura? Obrigando-nos a olhar para os textos com mais cuidado, analisando-os ao nível da qualidade da informação, da pertinência, da organização, da clareza, da comunicabilidade. Quantas vezes nos irritamos com um livro… ou melhor, com um autor que usa uma linguagem hermética, que enche as páginas de palha ou organiza a sequência de temas ou de ideias de uma forma confusa. Acontece com a escrita o mesmo que se passa com outras formas de criatividade, como a música ou as artes plásticas: a partir do momento em que somos obrigados a praticá-las a sério, de uma forma organizada, adquirimos a capacidade de analisar o trabalho dos outros com a capacidade de perceber como foi feito, os ensinamentos ou sugestões que dele se retira, as falhas que possa ter, as diferenças em relação ao nosso próprio trabalho ou ao trabalho de outros autores.
2) Por outro lado, a escrita é importante pelo processo de aprendizagem que exige – sobretudo a escrita orientada para um determinado tema, no âmbito de um determinado projecto. Para alguém ser capaz de escrever um texto coerente, compreensível e cientificamente correcto, tanto do ponto de vista do conteúdo como do ponto de vista da forma, é preciso ler muito e compreender aquilo que se lê, e é preciso treinar muito a forma como se processa a informação de maneira a reorganizá-la num objecto que se destina a satisfazer o nosso objectivo e a ser compreendido pelo nosso público.
Naturalmente, a Biblioteca não tem, por si só, a missão de substituir um trabalho que cabe aos professores das turmas. Como pode ela, então, trabalhar para esses fins? Penso que pode fazê-lo em duas circunstâncias: nas aprendizagens formais, pode fazê-lo apenas se o professor encomendar um trabalho de projecto aos seus alunos. Nesse caso, seja em parceria com os professores, seja porque os alunos procurem a biblioteca para realizarem os seus trabalhos. Nas aprendizagens informais (ou assim-assim), quando os alunos aderem a actividades, concursos e projectos, organizados pela biblioteca ou por organizações nacionais e internacionais. Daí surge a necessidade de fazer acções de charme junto dos colegas professores e de criar uma agenda de trabalho, uma programação que sirva para agendar as actividades de forma faseada e mais ou menos continuada – sem o que nos arriscamos a perder os bons hábitos que entretanto possam ter sido criados.
No momento em que o papel das bibliotecas está a ser redefinido e em que se procura consciencializar o público dessa redefinição, este é um dado importante a ter em conta. Após a instalação de uma rede nacional de bibliotecas, procura-se agora que estas aprofundem e intensifiquem a sua actuação. Para isso, espera-se que desenvolvam serviços e planos de actividades que permitam o desenvolvimento da literacia e que, em especial, as transformem em locais de aquisição e de produção de conhecimentos. Dos bibliotecários espera-se que sejam gestores de informação (não apenas de uma colecção) e que tenham, nas suas escolas, o papel de peritos em informação, incluindo na instrução do uso das novas e velhas tecnologias da informação.
O trabalho de projecto tem valor por muitas razões. Enquanto professor, desenvolvi-o com os meus alunos (umas vezes melhor do que outras) com dois grandes objectivos: desenvolver a capacidade de pesquisar, recolher e organizar informação; desenvolver a capacidade de apresentar essa informação por escrito e oralmente. Alguns alunos são peritos natos em qualquer forma de comunicação. Outros são muito bons numa e não tanto noutras. As melhores surpresas foram sempre as de alunos que nunca se exprimiram bem por escrito, mas que eram muito bons comunicadores orais, capazes de explicar os seus temas de trás para a frente e de fazerem comentários a intervenções ou perguntas inesperadas dos colegas ou do professor.
A biblioteca sempre foi um parceiro fundamental neste tipo de projectos, porque oferecia os documentos ou os meios informáticos a partir dos quais era possível obter informações. Os meios informáticos foram-se tornando um empecilho, porque facilitavam o plágio e a realização de trabalhos acéfalos. Obrigaram ao desenvolvimento de novas tácticas que, não invalidando o recurso à Internet, obrigavam os alunos a ler e pensar sobre a informação recolhida.
Algumas das muitas competências que podemos desenvolver através do trabalho de projecto são as da comunicação. Comunicar é uma das coisas mais importantes que podemos ensinar ou aprender nas escolas. Quando aqui me refiro a saber comunicar, refiro-me a fazê-lo de diferentes formas, para diferentes públicos e em diferentes contextos, cada um deles pressupondo objectivos e normas próprios que têm alguma razão de ser.
É importante saber comunicar por escrito, mas a comunicação escrita é apenas uma das modalidades ao nosso dispor, e não serve para todos os fins ou para chegar a todas as pessoas. Convém saber qual é a forma mais adequada de compor um determinado texto para uma determinada situação, o veículo ou canal utilizado para contactar o público e a forma como se deve sequenciar ou dramatizar o conteúdo.
Também é importante saber comunicar oralmente, visualmente (graficamente), utilizando música, utilizando as posturas corporais, as expressões faciais, o tom de voz… Os vários canais, as diferentes me, os múltiplos códigos que utilizamos quando comunicamos são complementares. Todos têm a sua importância. Todos são potencialmente úteis para atingir o objectivo da comunicação: afectar um público, modificando o conteúdo e/ou o funcionamento cognitivo e emocional da sua mente.
Comunicar é algo que fazemos de diversas maneiras: oral, escrita, gráfica... Ao longo dos seus 12 anos de escola, as crianças são ensinadas a fazê-lo de diferentes maneiras. É importante que as aprendam a todas, se bem que a maior parte de nós tenha maior facilidade em comunicar de uma determinada maneira e menos facilidade em comunicar de outras maneiras. Por exemplo, há alunos que são muito bons a escrever texto literário, mas que não são tão bons a escrever textos científicos e organizados por tópicos. Há alunos que têm dificuldade em escrever qualquer tipo de texto, mas que têm uma grande facilidade em comunicar oralmente.
Um dos papeis da escola é o de dar oportunidade a cada aluno para brilhar na modalidade que mais o favorece mas, ao mesmo tempo, incentivá-lo a desenvolver-se nas competências em que é mais fraco. O ideal é que no final dos seus doze anos de escola o aluno seja capaz de explicar ou defender ideias oralmente em discussões públicas, sem ter vergonha de se expor, e que seja capaz de escrever textos literários, informais ou técnicos - as diferentes modalidades de texto escrito - ainda que tenha uma clara preferência por algum deles.
Por fim, é preciso não esquecer que para haver comunicação é preciso ter alguma coisa para dizer. Um comunicador não é um simples actor, um intérprete. Ainda que um actor possa dizer excelentemente um texto, é preciso haver quem o escreva. Um autor eficiente produz um texto que tenha potencial para chegar ao público, preparando o caminho npara o sucesso do intérprete. Uma boa performance sem conteúdo não é comunicação. Um bom texto com uma performance tão má que afaste a atenção do público também não é comunicação.
A aplicação dos programas escolares nas aulas oferece oportunidades de aperfeiçoar e estruturar com perícia a comunicação escrita e a comunicação oral (se bem que esta tenda a ser preterida, devido à maior dificuldade em analisá-la e registá-la). Durante a prática pedagógica, a comunicação deve ser entendida a) como um objecto em si (é um elemento imprescindível para o trabalho quotidiano cujo teor varia entre as diferentes disciplinas), mas também b) como um resultado final de todo um processo educativo e/ou um projecto de estudo que foi desenvolvido.
a) Entendida como um elemento em si, ou melhor, que tem conteúdos e utilidade próprios, a aprendizagem da comunicação vale pela capacidade que nos dá de organizar ideias de forma lógica e pela atitude, fundamental à vida em sociedade e ao trabalho cooperativo, de pensar a partir da perspectiva do outro: se eu quiser ser um bom comunicador, não devo exprimir as minhas ideias à minha maneira, mas antes preparar ideias de interesse comum (que até podem ser as minhas) e apresentá-las de maneira a poderem ser facilmente organizadas, compreendidas e avaliadas pelos outros.
b) A apresentação escrita ou oral do resultado final de um projecto (um trabalho) um trabalho de preparação que obrigará a estudar determinadas matérias. Pode ser um trabalho feito de raiz pelos alunos ou um aprofundamento. Um trabalho feito com poucas indicações por parte do professor obriga a um maior esforço dos alunos, mas também oferece resultados mais profundos e duradouros. Em contrapartida, os riscos que cria são muito maiores. É um trabalho que favorece os alunos criativos e bem preparados. Um trabalho altamente estruturado oferece menos oportunidades à criatividade, mas favorece uma maior qualidade final e facilita a avaliação.
Como se disse, a biblioteca e o bibliotecário podem ser factores importantes na dinamização e no sucesso de trabalhos de projecto. Como temos ouvido e observado na literatura disponível sobre gestão de bibliotecas escolares, o papel de ambos é o de apoiar e desenvolver um conjunto de capacidades que são necessários para a apresentação do trabalho final. Esse trabalho será tanto mais produtivo quanto maior for o entrosamento entre o professor da turma/disciplina e a biblioteca.
Eis algumas sugestões para orientar a produção de um trabalho que implique alguma apresentação:
  1. Saber o que se vai dizer.
  2. Pensar no público (pessoa ou pessoas) a quem nos dirigimos.
  3. Escolher e conhecer os meios que serão utilizados para entrar em contacto com o público: uma apresentação oral “a capela”? Uma apresentação multimédia? Um trabalho escrito? Conhecer as regras, as vantagens e desvantagens e as exigências da utilização de cada meio.
  4. Procurar encantar o público e não ser maçudo – dizer o essencial, mas não mais do que o estritamente necessário. No final da comunicação pode-se fazer perguntas ao público para verificar a compreensão, no caso de o público não tomar a iniciativa de colocar questões. Numa apresentação com diapositivos (Power Point ou equivalente), convém colocar o mínimo de texto possível nos diapositivos e apresentar a informação oralmente. Os diapositivos são apenas um instrumento de apoio. Se quiser dar informação por escrito, distribua uma folha com um resumo.
  5. Ter presente o resultado que se pretende alcançar
  6. Encadear as ideias de uma forma que seja ao mesmo tempo lógica e clara para as pessoas a quem nos dirigimos
  7. Usar uma linguagem simples e clara
  8. Não fazer de conta que todos sabem informações importantes para que o texto (oral ou escrito) seja compreendido da forma que se pretende
  9. No caso de estar a defender uma opinião (texto argumentativo) justificar todas as opiniões e começar por dizer onde se quer chegar - não só é mais honesto como facilita a compreensão.
Paulo Sousa
Professor Bibliotecário do Agrupamento Vertical de Escolas Jacinto Correia

Documento de Trabalho

Os colegas do grupo de trabalho devem ler o seguinte documento, que será analisado na próxima reunião do dia 20 de Outubro:

http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/artigo5551.PDF

A BIBLIOTECA ESCOLAR NA FEIRA DA CIDADANIA/FESTA DA CRIANÇA DO CONCELHO DE LAGOA

O grupo de trabalho da Rede de Bibliotecas Escolares do concelho de Lagoa, com o apoio da Direcção Regional de Educação do Algarve , esteve presente na Feira da Cidadania/Festa da Criança que decorrer na cidade de Lagoa de 29 de Maio a 2 de Junho.
Esta participação apresentou duas vertentes: recriação de uma pequena biblioteca escolar e lançamento do livro “Era uma vez um cavalo: História colectiva”, realizado no âmbito da comemoração do Dia das Bibliotecas Escolares, nas várias escolas do concelho, e publicado com o patrocínio da Câmara Municipal de Lagoa.
Foram objectivos desta iniciativa divulgar o Programa da Rede de Bibliotecas Escolares junto da comunidade local, promover as competências da literacia e o gosto pela leitura, envolvendo o pais e filhos.
O lançamento do livro “ Era uma vez um cavalo : história colectiva” realizou-se hoje, dia 1 de Junho, pelas 17.30. A apresentação esteve a cargo da Coordenadora Local da RBE, Professora Madalena Santos, e contou com a presença da interlocutora do Programa da Rede de Bibliotecas Escolares na Drealg, Drª Filomena Branco e da Bibliotecária Municipal, Drª Clara Andrade.



Regulamento Do Grupo De Trabalho Lagoa


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